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29.8.11

Só depende da Gente


1Se você quer ajudar a corrupção, basta não fazer nada!
Mas...

A Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político Brasileiro e o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral lançaram  a Proposta de Iniciativa Popular de Reforma Política e iniciaram a coleta de assinaturas para envio da proposta ao Congresso Nacional.
 Você pode ajudar na coleta de assinaturas. Clique aqui para acessar o formulário. Imprima quantas cópias puder e leve para seus amigos, vizinhos, colegas de trabalho, familiares.
Na mesma página há um folder com explicações básicas sobre a proposta, que também pode ser impresso.
Para aprofundar-se no tema e conhecer a proposta apresentada , clique aqui.
           
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24.8.11

Carta às esquerdas, por Boaventura de Souza Santos


Carta às Esquerdas
Boaventura de Sousa Santos – Visão - 25 Agosto de 2011

Não ponho em causa que haja um futuro para as esquerdas
mas o seu futuro não vai ser uma continuação linear do seu passado.
Definir o que têm em comum equivale a responder à pergunta: o
que é a esquerda? A esquerda é um conjunto de posições políticas
que partilham o ideal de que os humanos têm todos o mesmo valor,
e são o valor mais alto. Esse ideal é posto em causa sempre que há
relações sociais de poder desigual, isto é, de dominação. Neste caso,
alguns indivíduos ou grupos satisfazem algumas das suas
necessidades, transformando outros indivíduos ou grupos em meios
para os seus fins. O capitalismo não é a única fonte de dominação
mas é uma fonte importante.
Os diferentes entendimentos deste ideal levaram a diferentes
clivagens. As principais resultaram de respostas opostas às
seguintes perguntas. Poderá o capitalismo ser reformado de modo a
melhorar a sorte dos dominados, ou tal só é possível para além do
capitalismo? A luta social deve ser conduzida por uma classe (a
classe operária) ou por diferentes classes ou grupos sociais? Deve
ser conduzida dentro das instituições democráticas ou fora delas? O
Estado é, ele próprio, uma relação de dominação, ou pode ser
mobilizado para combater as relações de dominação? As respostas
opostas as estas perguntas estiveram na origem de violentas
clivagens. Em nome da esquerda cometeram-se atrocidades contra a
esquerda; mas, no seu conjunto, as esquerdas dominaram o século
XX (apesar do nazismo, do fascismo e do colonialismo) e o mundo
tornou-se mais livre e mais igual graças a elas. Este curto século de
todas as esquerdas terminou com a queda do Muro de Berlim. Os
últimos trinta anos foram, por um lado, uma gestão de ruínas e de
inércias e, por outro, a emergência de novas lutas contra a
dominação, com outros actores e linguagens que as esquerdas não
puderam entender. Entretanto, livre das esquerdas, o capitalismo
voltou a mostrar a sua vocação anti-social. Voltou a ser urgente
reconstruir as esquerdas para evitar a barbárie.

Como recomeçar? Pela aceitação das seguintes ideias.

Primeiro, o mundo diversificou-se e a diversidade instalou-se no
interior de cada país. A compreensão do mundo é muito mais ampla
que a compreensão ocidental do mundo; não há internacionalismo
sem interculturalismo.

Segundo, o capitalismo concebe a democracia
como um instrumento de acumulação; se for preciso, redu-la à
irrelevância e, se encontrar outro instrumento mais eficiente,
dispensa-a (o caso da China). A defesa da democracia de alta
intensidade é a grande bandeira das esquerdas.

Terceiro, o capitalismo é amoral e não entende o conceito de dignidade
humana; a defesa desta é uma luta contra o capitalismo e nunca com
o capitalismo (no capitalismo, mesmo as esmolas só existem como
relações públicas).

Quarto, a experiência do mundo mostra que há imensas realidades não capitalistas, guiadas pela reciprocidade e pelo cooperativismo, à espera de serem valorizadas como o futuro dentro do presente.

Quinto, o século passado revelou que a relação dos humanos com a natureza é uma relação de dominação contra a qual há que lutar; o crescimento económico não é infinito.

Sexto, a propriedade privada só é um bem social se for uma entre várias
formas de propriedade e se todas forem protegidas; há bens comuns
da humanidade (como a água e o ar).

Sétimo, o curto século das esquerdas foi suficiente para criar um espírito igualitário entre os humanos que sobressai em todos os inquéritos; este é um
património das esquerdas que estas têm vindo a dilapidar.

Oitavo, o capitalismo precisa de outras formas de dominação para florescer,
do racismo ao sexismo e à guerra e todas devem ser combatidas.

Nono, o Estado é um animal estranho, meio anjo meio monstro,
mas, sem ele, muitos outros monstros andariam à solta, insaciáveis à
cata de anjos indefesos. Melhor Estado, sempre; menos Estado,
nunca.

Com estas ideias, vão continuar a ser várias as esquerdas, mas
já não é provável que se matem umas às outras e é possível que se
unam para travar a barbárie que se aproxima.
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10.6.11

Adivinha quem é a novidade


Assine este manifesto:
Se você está insatisfeito com a política, com a forma como as pessoas tratam as pessoas, como as pessoas tratam o ambiente e está esperando que algo aconteça, entenda:
A novidade é você

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12.5.11

Diálogo sobre Economia Solidária e Reforma Política


ECONOMIA SOLIDÁRIA – TAMBÉM UM NOVO JEITO DE FAZER POLÍTICA
 O debate sobre a forma de se fazer política é coisa que não vem de hoje e também não é só daqui.  É a grande discussão que o Fórum Social Mundial trouxe de forma mais explícita.  Aí, o Fórum Brasileiro de Economia Solidária (FBES), como filho legítimo do fórum Social Mundial (FSM), herdou o gérmen da radicalização da democracia (Aliás, nossa 1ª revista, de 2002, tem como título: Radicalização da Democracia). Note-se que radical significa ir às raízes, às bases e fundamentos; coisa bem diferente de extremismo ou sectarismo (que tem a ver com seita).
 A denominada Economia Solidaria e Autogestão ao propor gestão coletiva das realidades objetivas (negócio, por exemplo) traz junto a idéia da gestão coletiva das coisas subjetivas  que envolvem o relacionamento e a organização das pessoas. Isto inclui a forma de se fazer política. Aliás, esta também é uma herança do FSM porque o corolário de Um Outro Mundo Possível significaria: Uma Outra Política é Possível.
 Hoje, vivemos uma crise nas formas denominadas “democráticas” de se fazer política. Os instrumentos tradicionais (partidos e sindicatos) não estão dando conta da gestão pública que a sociedade e sua relação com a natureza demandam. 
Existe a visão de que política só se faz através da denominada Democracia Representativa Tradicional, cujo processo eleitoral elege representantes que dependem muito de recursos financeiros de campanha (diretos ou indiretos), possuem fóruns especiais de negociação, muitas vezes sem prestar contas de seus mandatos ou gestão e vivem em regime de irrevogabilidade de seus mandatos. Nisto os Partidos Políticos se parecem cada vez mais com empresas de propaganda e marketing.  Os que no começo não são assim, ficam depois.  Os que parecem diferentes são apenas lados de uma mesma moeda, como o Republicano e o Democrático nos EUA, por exemplo.
 No processo de empresariamento partidário e financeirização de campanhas e, em suma, de adaptação ao mercado, vale a lei da concorrência onde existem apenas dois lados: o seu e o do concorrente. Porém para se chegar a isso é só começar a perder a capacidade de ver que além do inimigo existem os que são simplesmente adversários e, principalmente, os parceiros. Não é só para Busch que “quem não fecha comigo (com meu partido) é meu inimigo”.
 Estamos falando, além dos problemas e limites, das virtudes e potencialidades: estamos falando da importância estratégias e alianças que possam combinar as políticas partidárias com organizações e movimentos sociais. Isto é muito diferente de achar que política só se faz nas instâncias partidárias e que daí se leva a orientação para os movimentos sociais. 
Não estamos negando a importância da política partidária e sindical; só dizendo que não são os únicos instrumentos e tampouco a única maneira de se fazer política. Esta discussão também deve ser ampliada para outras organizações partidárias menores - muitas vezes, chamadas “organizações políticas” - que possuem a mesma forma organizacional com semelhante funcionamento vertical . Contudo, deve-se considerar que estas últimas têm, às vezes, a virtude de investir em escola de formação política e ideológica para seus quadros.   
Contudo, educar pela forma de se fazer política (pelo método e pelas práticas políticas) é onde está o nó da questão. Por quê? Porque nós falamos que educamos de três formas: 1) na economia solidária e autogestão; 2) para a economia solidária e autogestão; 3) pela (ou através da) economia solidária e autogestão.  Isto significa que economia solidária e autogestão é uma escola da democracia. Ou melhor: escola de radicalização da democracia porque pode envolver nossa vida enquanto trabalhador e enquanto cidadão, que se relaciona e consome. Nós estamos aprendendo a tratar da (auto)gestão da nossa economia, da finança solidária (incluído o crédito), da administração, organização e do nosso consumo dentro de uma perspectiva de sus tentabilidade social e ambiental. 
 Quando falamos, de forma resumida, que estão em disputa dois modelos - um que centraliza nas organizações tradicionais, outro que enfoca na autogestão e decisões coletivas - não quer dizer que defendemos uma coisa ou outra. Quer dizer que não queremos alienar, por exemplo, nossa capacidade e direito de definir as coisas estratégicas e nossa política. Se abrirmos mão, hoje, do poder de decisão das questões essenciais estaremos optando pela subalternidade de amanhã. É uma pobreza porque se deixarmos de ser sujeitos, deixaremos de ser, simplesmente.
 As relações das políticas governamentais com os movimentos e organizações sociais requerem amadurecimento. Amadurecimento para a adequada parceria com os movimentos e organizações sociais, contemplando, por exemplo, seus princípios, métodos de atuação e características organizacionais. Sobre isto, quanto da riqueza dos movimentos e organizações sociais são perdida pelo simples fato de aqueles que deveriam promovê-los, simplesmente, vampirizam suas essências! 
Sobre institucionalização e o movimento, ou sobre a estrutura e a base, vale a pena avaliar a política dos governos da social-democracia e também de origem comunista na Europa (Espanha, Itália e França): foram eleitos pelos trabalhadores e deixaram em enorme crise o movimento sindical. Como os trabalhadores e suas organizações deveriam se relacionar com o governo que ajudou a eleger? Os sindicatos e principalmente as centrais sindicais ficaram estagnadas, quando não retrocederam. Resultado: muitos foram para a retração política enquanto os poucos que começaram a buscar continuidade de lutas encontraram muita dificuldade, como por exemplo, os metalúrgicos na Itália, a partir de 2002.
 Na América Latina (especialmente, Brasil, Venezuela, Equador, Uruguai, Bolívia, Argentina, Paraguai e Nicarágua) depois de governos ditatoriais e autoritários, surgem perspectivas de conquistas e de avanço da democracia. Contudo, é de se perguntar das políticas públicas com relação aos movimentos sociais, partidos, sindicais e sobre atividades com relação à etnia, gênero e meio ambiente. È de se avaliar o investimento que se faz no presente para garantir saldos políticos, sociais e culturais após gestão dos governos progressistas ou democrático-populares. O que está sendo feito para educar, conscientizar, e promover a organização da sociedade? Por acaso não se mede o resultado pelo que se propiciou para garantir e ampliar o exercício da democracia (econômica, cultural e política) e para atender aos in teresses da maioria?
 O que ficará, de fato, depois destes governos progressistas? Qual será o saldo deste processo? O que sobrará para a sociedade dos homens e mulheres que habitam esta região? Talvez devêssemos perguntar o quanto e em quê cada governo está promovendo os movimentos e as organizações sociais mais autônomas e com perspectivas de desenvolvimento e de sustentabilidade.
 Daí a necessidade de politizar nossos embates e de promover politização de nosso cotidiano de homens e mulheres que vivem juntos projeto autogestionário, envolvendo as pessoas na vida pública e também na partilha a vida privada. Por conta disso dizemos que economia solidária e autogestão não é apenas um projeto econômico. É um projeto sociedade e de vida.
Abraço
Luigi Verardo - ANTEAG


Oi Luigi e compas da ecosol

Taí um tema que merece todo nosso esforço de elaboração e mobilização.

Seu texto, Luigi, coloca com brilhantismo e objetividade uma dimensaão que o nosso Movimento por uma Economia Solidária precisa avançar, a política. Extamente pq a Economia Solidária é, na verdade, um projeto de sociedade que jamais vingará sua dimensão econômica se não alterar a cultura política da Sociedade.

É fundamental compreender que o maior obstáculo à adoção da cultura da solidariedade na economia, está em seu exercício no poder, já que a política é a síntese dos valores mais caros em uma Sociedade. Isto vale para as grandes estrutras econômicas e políticas assim como vale para as relações em um empreendimento, que se não tiver democracia interna, jamais será plenamente de Economia Solidária. Ou ainda, enquanto tivermos empreendimentos onde os dirigentes não decidem coletivamente o que fazer, não prestam conta de suas atitudes e do movimento financeiro que administra, também não teremos Economia Solidária. Sei que enfrentar esta pauta causa incômodo porque nem sempre vemos no espelho o que gostaríamos mas " triste do revolucionário que não revoluciona a si mesmo" ...

Neste momento de Reforma Política, entendo que esta responsabilidade se exponencializa. Talvez nosso fórum pudesse compor uma comissão nacionmal para pensar formas concretas de participar deste processo que é, em si, uma oportunidade de avanço de transformações no sentido do aprofundamento democrático republicano, ou de seu retrocesso.

Na prática, precisamos debater proposições que ampliem as técnicas políticas no sentido de viabilizar a participação direta e o Controle Social. Por exemplo:

1. O direito de desvotar: já há tecnologia para registrar votos identificados por códigos/senha que permite a qualquer momento o eleitor ir no site do TRE e retirar o voto, e quando o eleito perdesse o número de votos para se eleger, perderia o mandato.
2. O direito a fiscalizar diretamente qualquer função pública nos três poderes, mediante inscrição específica.
3. A criação da Câmara Nacional de Controle Social, em composição entre DCGU e MP para servir de apoio técnico às demandas sociais de transparência pública
4. A exigência de prévia autorização de quebra de sigilo telefônico, bancário e fiscal para o exercício de todos e qualquer cargo de confiança.
5. Exigência de participação direta em todo processo de elaboração e execução do Orçamento Público, desde o PPA(plano Pluri Anual) até a LOA(Lei Orçamentária Anual)
6. Exigência de lista de apoio exclusivo para a inscrição de candidaturas, inclusive avulsas(sem filiação partidária)
7. Introdução da Educação Política, com ênfase na Participação e Controle Social, na Escola.
8. Lei da Responsabilidade Democrática: definir procedimentos democráticos mínimos de transparência, participação e Controle Social sobre organizações públicas e privadas, cuja inadimplência teria as mesmas consequências da inadimplência financeira.

Precisamos resonhar a democracia, uma democracia solidária para uma economia solidária.

Abraço

Arroyo – ISSAR

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28.4.11

Prato cheio para o clientelismo político


“A adoção do Voto Distrital no Brasil seria um prato cheio para o clientelismo”

Dr. Márlon Jacinto Reis, Juiz no Estado do Maranhão e Presidente da Abramppe, fala com os internautas sobre o distritão.

A proposta do voto distrital que estão discutindo, o tal "distritão", tem o objetivo de prejudicar partidos emergentes, só interessa ao PMDB. Com essa proposta os partidos serão reduzidos a quase nada, pois os candidatos não precisarão deles para se eleger, sem falar que a briga dentro da própria legenda será ainda pior do que já é hoje.
O voto distrital não facilita o controle, mas facilita o clientelismo. Os patronos assumirão o controle vitalício e hereditário dos distritos. O distrito é o ambiente perfeito para a compra de votos. Será o fim dos partidos, que serão oficializados como simples exigência burocrática para a candidatura .
Até o sistema atual é melhor do que isso. Os deputados serão de uma vez por todas sim, simples despachantes, interessados apenas em carrear recursos para o Distrito, secundarizando os debates estratégicos nacionais.
As listas partidárias têm que ser bem compostas, se o partido quiser ser bem votado. Um deputado que participou de um escândalo não entra, porque compromete a votação de toda a lista. Figuras inexpressivas também não terão destaque nas listas. Por outro lado, a lei deve exigir que a lista seja formada por votação dos filiados e não por escolha do diretório.
A lista pré-ordenada é transparente. Sabe-se exatamente o impacto do voto. Ela é, ao contrário, um antídoto já testado em outras nações contra o caciquismo e o clientelismo, já que a base para coesão nos partidos fisiologistas é a possibilidade de alcance do mandato. Se o cacique dita qual é a ordem, o que manterá unidos os que não forem contemplados? Só partidos sustentados por programas permanecem coesos após a escolha da lista.
Na Espanha, após quase meio século de ditadura de Franco, optou-se pela lista fechada e bloqueada como meio de impedir o controle da política por patronos locais. O resultado foi a saída da Espanha da condição de quintal da Europa para a posição de destaque que tem hoje , com o maior percentual do mundo de adultos com formação superior. Lá as eleições são debates ideológicos, propiciados pela ação de partidos delineados programaticamente. E o sistema foi implantado num pais pobre e analfabeto.
A lista pré-ordenada, que chamo de lista transparente, é o meio propício para o desenvolvimento de partidos identificados com programas.
A formação da lista deve obedecer a uma lógica de coesão partidária, pois se ela não tiver uma lógica interna, se justificando perante os demais membros do partido e especialmente entre os demais pretendentes, o partido se dissolve. Não dá para empurrar pessoas na lista.
O partido naturalmente iria zelar pela lista: não colocaria candidatos envolvidos em escândalos. Se colocado tal candidato ( corrupto, fraudulento, desonesto, desleal, indigno), este afastaria os eleitores, mais do que agregaria.
Portanto, a lógica na lista partidária, não é a atual (lógica) de deputados isolados, mas a de grupos. Passa-se da fase primitiva da política de indivíduos para a de sujeitos coletivos.
Com votações individuais, em que membros de um partido tem que disputar o voto com correligionários, não é possível formar partidos programáticos . Já no voto distrital, os partidos acabam de vez, pois só importa a pessoa, a figura pessoal dos candidatos. Se hoje um grupo de ambientalistas quiser formar um partido, será destruído pela lógica. Só a disputa interna, exigida pelo sistema que leva uns a disputarem votos com os outros . Se houvesse lista fechada, todos atuariam como um bloco. Já os partidos em que prevaleça o fisiologismo não consegue alcançar a coesão necessária para manter todos unidos em torno de uma lista formada por um cacique. Por que os outros ajudariam, se foram vítimas de uma prática democrática dentro do partido?
Pensemos num "político" famoso de São Paulo, que quase presidiu o Brasil. Ele tem muitos votos para se eleger deputado mas a rejeição a ele é tão forte que ele seria considerado um praga por qualquer lista partidária. Sua votação individual é muito forte. Ele seria eleito por muitos distritos em São Paulo. Poderia escolher o distrito onde ficaria para sempre eleito sem fazer campanha. Mas numa lista partidária, sua presença seria muito danosa para o coletivo, que teria apenas a votação que hoje já pertence a esse polêmico parlamentar, o que levaria seu partido a um fracasso nas urnas. Temos portanto de fugir da idéia de vinculação de parlamentares com o distrito. O papel de proximidade com o povo é dos vereadores, prefeitos e o governo do Estado. A Câmara dos Deputados deve pensar leis para o Brasil. Sua função é genérica, abstrata, não paroquial. O Parlamento precisa ser uma representação das ideologias que vicejam no Brasil, não uma disputa para para ver quem individualmente tem mais voto .As mulheres são 9% do parlamento e 51% da população. E os índios, não são brasileiros. Não há um só deles no Congresso Nacional.
Há necessidade urgente de uma reforma partidária. Ela é o ponto de partida para tudo. Para quem defende voto distrital, esqueça a reforma partidária. Os partidos acabarão no Brasil, que será um pais de caciques num País dividido em feudos. Pergunta-se: Se tivermos voto distrital, como será a divisão das circunscrições eleitorais? E é aí que está: É o Parlamento quem fará a divisão. Como acham que ela será feita? Os mais fortes derrotarão os mais fracos, fixando distritos em suas bases eleitorais. Quase vejo como ficará o Maranhão: Um Estado dividido em distritos. Cada um será dominado por um patrono que irá a Brasília apenas para buscar recursos para a sua clientela.O Brasil já teve o voto distrital. Foi assim no Império e na República Velha. Foi preciso uma revolução (a de 1.930) para que o sistema fosse mudado. Ele acabava com as minorias. Os eleitos nos distritos eram, sempre, por razões óbvias, os que eram ligados ao Governo.
Imaginem as eleições de 2.010 quando o Presidente tinha elevados índices de aprovação. Em quantos distritos venceriam pessoas que o criticassem? Os candidatos apoiados pelo partido se aproveitariam da popularidade do Presidente, e ainda seriam vistos como os que mais poderiam trazer de Brasília, para os seus distritos.A oposição teria sido esmagada.
Por fim, a lista fechada não é o modelo ideal, mas é o único que permite o desenvolvimento de partidos ideológicos, coisa de que o Brasil já precisa, mas não propicia o ambiente adequado para que surjam e cresçam. Não podemos estancar o amadurecimento da idéia.O sistema de votação em listas é bastante utilizado no mundo e pode ser uma alternativa Não existe somente o sistema de lista fechada como em alguns locais da Espanha ou mesmo em Portugal, em que fica a cargo do partido a escolha dos lugares . Por exemplo a Suécia, Holanda, Dinamarca e Finlândia, que estão entre os dez países menos corruptos do Mundo, onde o penúltimo inclusive ocupa o primeiro lugar, utilizam o sistema de lista semi-aberta, onde não cabe ao Partido determinar exclusivamente qual o candidato que irá ocupar o lugar, por conta do número de votos nos candidatos individuais.
É necessário também aprofundar a discussão sobre o voto distrital o qual, poderá ser combinado com o sistema de lista semi aberta. Na Espanha, que deu um salto social e político formidável nos últimos 20 anos, agora se começa a pensar em flexibilizar a lista. Mas hoje o grau de amadurecimento da democracia é outro. O ideal é que se possa alterar a ordem da lista, mas isso é mais recomendável para democracias robustas e consolidadas. Na Itália, sob a vigilância do voto preferencial, pesquisas demonstram que as regiões de melhores indicadores sociais votavam em siglas partidárias, enquanto as mais empobrecidas votavam em pessoas, por causa do clientelismo. Há excelente pesquisa sobre o assunto em livro de Robert Putnam HTTP://www.oab.org.br/noticia.asp?id=21635
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19.4.11

A gente não quer só comida... a gente quer Participação Política e Controle Social


Desemprego tem a menor taxa para o mês de março desde 2002, diz IBGE


As manchetes festejam o desempenho econômico, mas queremos ir além


População desocupada somou 1,5 milhão de pessoas.

Rendimento médio real dos ocupados foi de R$ 1.557.

Do G1, em São Paulo e no Rio
A taxa de desemprego nas seis regiões metropolitanas pesquisadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) ficou estável em março, ao passar de 6,4% em fevereiro para 6,5%, conforme aponta levantamento divulgado nesta terça-feira (19). No entanto, segundo o estudo, a taxa é a menor para o mês de março desde o início da série histórica, em março de 2002. Em relação ao mesmo período do ano passado, a queda foi de 1,1 ponto percentual.
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A população desocupada somou 1,5 milhão de pessoas e não apresentou variação em relação ao mês anterior, conforme informou o IBGE. Já em relação ao mesmo período do ano passado, houve queda de 14% (menos 250 mil pessoas).
A população ocupada chegou a 22,3 milhões e apresentou estabilidade sobre fevereiro. Na comparação anual, foi registrada alta de 2,4% (mais 531 mil ocupados). O número de trabalhadores com carteira assinada no setor privado foi de 10,7 milhões, ficando estável. Em relação ao mesmo período de 2010, foi verificado crescimento de 7,4% (mais 739 mil postos de trabalho com carteira assinada).
“A taxa de desocupação do primeiro trimestre deste ano (6,3%) é menor do que a taxa registrada em todo o ano de 2010 (6,7%). Com isso, a gente pode ver para onde o ano está caminhando”, disse Cimar Azeredo, gerente da Coordenação de Trabalho e Rendimentos do IBGE.


Salários
O rendimento médio real dos ocupados foi de R$ 1.557, apresentando alta de 0,5% sobre fevereiro e de 3,8% na comparação com março.
Por região
Na comparação mensal, o desemprego teve variação significativa, segundo o IBGE, somente em Belo Horizonte, que viu a taxa passar de 6,3% para 5,3%. Na comparação anual, foram registradas quedas em Belo Horizonte (1,0 ponto percentual), Rio de Janeiro (1,5 ponto percentual), São Paulo (1,3 ponto percentual) e Porto Alegre (0,9 ponto percentual).
Nível de ocupação
O nível da ocupação (proporção de pessoas ocupadas em relação às pessoas em idade ativa), estimado em 53,3% no total das seis regiões, não variou em relação a fevereiro, mas subiu 0,6 ponto percentual sobre o mesmo período do ano passado. Na comparação mensal, todas as regiões tiveram estabilidade nesse indicador. Sobre março de 2010, foi verificada alta em Porto Alegre (1,9 ponto percentual) e em São Paulo (1,0 ponto percentual). As outras regiões não tiveram variação significativa, segundo o IBGE.
“A taxa de desocupação no mês de março e no primeiro trimestre deste ano foi a menor já registrada desde o início da pesquisa, em 2003. É um outro recorde registrado neste mês”, disse.

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13.4.11

EM DEFESA DOS RIOS, DA VIDA E DOS POVOS DA AMAZÔNIA


CARTA DE BELÉM

EM DEFESA DOS RIOS, DA VIDA E DOS POVOS DA AMAZÔNIA
 Os participantes do seminário “Energia e desenvolvimento: a luta contra as hidrelétricas na Amazônia”, após ouvirem professores e pesquisadores de importantes universidades afirmarem que Belo Monte não tem viabilidade econômica, pois vai produzir somente 39% de energia firme, 4,5 mil MW dos 11 mil prometidos. Afirmarem ainda que a repotenciação de máquinas e equipamentos e a recuperação do sistema de transmissão existente poderiam acrescentar quase duas vezes o que esta usina produziria de energia média, investindo um terço do que se gastaria na construção de Belo Monte.
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11.4.11

Fiori revela o que está acontecendo na África e no Oriente Médio



Guerra na África é nova corrida imperialista, diz Fiori

Recomendado pelo Prof. Antônio Maués, Dr em Direito Constitucional, por ELEONORA DE LUCENA, DE SÃO PAULO, 04/04/2011 - 07h01
A guerra na Líbia faz parte de uma nova corrida imperialista que vai se aprofundar, diz José Luís Fiori, coordenador do programa de pós-graduação em economia política internacional da UFRJ. Para ele, potências disputam recursos estratégicos na África, mas os conflitos não têm a ver apenas com o petróleo. Nesta entrevista, Fiori fala também sobre o poder dos EUA, que ele enxerga vivendo uma crise se crescimento. A seguir a íntegra da entrevista.

Folha -Como o sr. analisa a guerra na Líbia?
*José Luís Fiori-" É evidente que não se trata de uma discussão sobre o direito a vida dos líbios, ou sobre os chamados direitos humanos, e menos ainda, sobre democracia. Nesta, como em todas as demais intervenções deste tipo, de europeus e dos EUA, feitas neste último século, jamais se esclarece a questão central de quem tem o direito de julgar e arbitrar a existência ou não de desrespeito aos direitos humanos em algum país em particular, e quem determina o lugar em que a "comunidade internacional" deve ou não intervir para defender vidas e direitos. Com relação a quem arbitra, são sempre os mesmos países que Samuel Huntington chamou de "diretório militar" do mundo, ou seja, EUA, Inglaterra e França. E, com relação aos critérios da arbitragem, é óbvio que este diretório jamais intervém contra um país, ou contra um governante aliado, por mais autoritário e anti-democrático que ele seja, e por mais que ele desrespeite os direitos defendidos pelos europeus e pelos norte-americanos. Independentemente do que se pense sobre o fundamento e a universalidade dos direitos humanos, não há a menor dúvida que, do ponto de vista das relações entre os Estados dentro do sistema mundial, eles sempre são esgrimidos e utilizados como instrumento de legitimação das decisões geopolíticas e geo-economicas das grandes potencias. Por isto, as decisões sobre este assunto nos foros internacionais são sempre políticas e instrumentais e variam segundo a vontade e segundo os interesses estratégicos destas grandes potências.

A guerra é sobre o petróleo?
O que está em jogo na Líbia não é apenas Petróleo. Nem tudo no mundo da geopolítica e da luta de poder entre as grandes e médias potências tem a ver com energia, ou mesmo, com economia. Neste caso, está em jogo o controle de uma região fronteiriça da Europa, parte importante do Império Romano, e território privilegiado do alterego civilizatório da "cristandade". Foi por onde começou o colonialismo europeu, no século 15 e depois, de novo, no século 19. Acho que já estamos assistindo uma nova corrida imperialista na África, e que não é impossível que se volte a cogitar de alguma forma renovada de colonialismo.

Como seria essa corrida imperialista? O que deve acontecer por lá? As revoltas árabes em curso terão algum impacto no poder dos Estados Unidos na região e no mundo?
Durante a década de 90, generalizou-se a convicção de que a África seria um continente inviável e marginal dentro do processo vitorioso da globalização econômica. Tratava-se de um continente que não interessaria às grandes potências nem às suas corporações e bancos privados. Mas a África não é tão simples nem homogênea, com seus 53 Estados, cinco grandes regiões e seus quase 800 milhões de habitantes. Um mosaico gigantesco e fragmentado de Estados, onde não existe um verdadeiro sistema estatal competitivo, nem tampouco se pode falar de uma economia regional integrada De fato, o atual sistema estatal africano foi criado pelas potências coloniais europeias e só se manteve integrado, até 1991, graças à guerra fria e à sua disputa bipolar. Depois da guerra fria e do fracasso da intervenção dos Estados Unidos na Somália, em 1993, os EUA redefiniram sua estratégia para o continente negro: propondo, como objetivo central, o crescimento econômico, através dos mercados, da globalização e da democracia. Mas de fato, a preocupação dos Estados Unidos com a África se restringiu até o fim do século 20, quase exclusivamente, à disputa das regiões petrolíferas e ao controle e repressão das forças islâmicas e dos grupos terroristas do Chifre da África. Mas deverá ocorrer uma mudança radical, nas próximas duas décadas, do comportamento norte-americano e dos europeus, graças à invasão econômica da China da Rússia, da Índia e, inclusive, do Brasil. A África será de novo um ponto central da nova corrida imperialista que já está em curso e que deverá se aprofundar ainda mais na próxima década Neste período, não é improvável, inclusive, que as velhas e novas potências do sistema mundial, envolvidas na disputa pelos recursos estratégicos da África, voltem a pensar na possibilidade de conquista e dominação colonial de alguns dos atuais países africanos que foram criados pelos próprios colonialistas europeus. E é nesta perspectiva que acho que deve refletir sobre a reação européia e norte-americana frente às revoltas árabes. E, em particular, no caso da intervenção militar na Líbia, comandada pela Otan e liderada pelos EUA, Inglaterra e França.

Os EUA estão ameaçados de perder poder no Oriente Médio?
Sempre existe o risco de perda do controle que já tinham conquistado na situação anterior à rebelião. Mas, neste caso, não vejo este risco. Pelo contrário, acho que são os mesmos de sempre que estão redistribuindo as cartas e manipulando as divisões internas dentro dos governos e dos envolvidos nas rebeliões. Quando houver risco real, reprimirão como fizeram no Bahrein. Sempre que possível através das mãos de terceiros.

Para o sr. não há perda da hegemonia norte-americana?
Os EUA estão enfrentando neste momento os problemas, contradições e incertezas produzidas pela sua mudança de status _ da condição de "potência hegemônica do mundo capitalista, até a década de 1980, para a condição de "potência imperial", assumida progressivamente depois de 1991. Poderia até se chamar de uma "crise de crescimento", e não uma "crise terminal". E o seu "declínio relativo", de que tanto se fala na imprensa, com relação à expansão asiática e à sua provável ultrapassagem econômica pela China ,não atingirá a posição dos EUA, como pivot do sistema mundial, nas próximas duas décadas, pelo menos.
Este novo estatuto imperial dos EUA deve fazer com que mudem sua forma de administrar o seu poder global. Esta mudança será lenta e complicada, dentro e fora dos EUA. Muitos analistas confundem a trepidação própria deste processo de mudança com uma "crise terminal" do poder americano no mundo. A partir de agora, e cada vez mais, os EUA deverão adotar uma posição mais distante e arbitral com relação às lutas de poder em todos os tabuleiros geopolíticos do mundo. Só intervindo em última instância e, de preferência, através das mãos de terceiros países. E deverão promover ativamente todo tipo de divisões internas, dentro e fora dos principais países dentro de cada um destes tabuleiros. Seguindo o modelo clássico da administração imperial da Grã-Bretanha, durante o século 19. Isso não acontecerá sem conflitos. Mas este será o jogo que estará sendo jogado nas próximas duas décadas: de um lado, os EUA atuando como cabeça de império, se distanciando, e só intervindo em última instância, e, do outro, as demais potências regionais tentando escapar do cerco americano, através de coalizões de poder que neutralizem o divisionismo estimulado pelos EUA.

Quais as diferenças em relação ao império britânico?
Trata-se de um sistema imperial muito mais complexo e instável do que foi o império britânico, porque ele é supra-nacional sem ser colonial. E envolve, potencialmente, 195 Estados e economias nacionais, que são ou se consideram soberanos. As fronteiras deste império não são fixas nem territoriais e podem ser redefinidas a cada momento pelo poder global militar e financeiro dos EUA. E, dentro deste sistema, a expansão contínua do poder e da riqueza americana promovem e fortalecem algumas novas potências emergentes que deverão competir com os EUA, nas próximas décadas, pelas hegemonias regionais do mundo. É importante sublinhar que este novo tipo de império não exclui a possibilidade de derrotas ou fracassos militares localizados dos EUA. Pelo contrário: é a própria expansão vitoriosa dos EUA - e não o seu declínio_ que vai promovendo os conflitos e as guerras. E, do ponto de vista estritamente militar, o essencial para o novo poder imperial americano é impedir que alguma potência regional ameace a sua supremacia naval em qualquer região do mundo. E, é óbvio, impedir que ocorra uma guerra hegemônica capaz de atingir a sua supremacia militar global.

Não há limites para este poder?
É óbvio que este novo poder imperial não é absoluto nem será eterno. Como já foi dito, sua expansão contínua cria e fortalece poderes concorrentes. E desestabiliza e destrói os equilíbrios e as instituições, criadas pelos próprios EUA, estimulando a formação de coalizões de poder regionais que acabarão desmembrando aos poucos o seu poder imperial, como aconteceu com o império romano. Por outro lado, a nova engenharia econômica mundial deslocou o centro da acumulação capitalista e transformou a China numa economia com poder de gravitação quase equivalente ao dos Estados Unidos. Esta nova geo-economia internacional intensifica a competição capitalista e já deu início à uma "corrida imperialista", cada vez intensa na África e na América do Sul, aumentando a possibilidade e o número dos conflitos localizados entre as grandes potências. Além disso, o poder imperial norte-americano deverá enfrentar uma perda de legitimidade crônica dentro dos EUA, porque a diversidade e a complexidade nacional, étnica e civilizatória do seu império é absolutamente incompatível com a defesa e a preservação de qualquer tipo ou sistema de valores universais, como pretendem os norte-americanos. Daí o aumento das divisões, cada vez mais profundas, dentro do establishment da política externa dos EUA, e também dentro da sociedade americana, com aumento da radicalização das posições e conflitos, como no caso do Tea Party, e das manifestações Madison, Wisconsin etc. De qualquer forma, é possível dizer, com relação ao futuro, que não existe nenhuma lei que defina a sucessão obrigatória e a data do fim da supremacia americana. Mas é absolutamente certo que a simples ultrapassagem econômica dos EUA não transformará automaticamente a China numa potência global nem, muito menos, no líder do sistema mundial. Além disso, é possível afirmar que terminou definitivamente o tempo dos pequenos países conquistadores. O futuro do sistema mundial envolverá, daqui para frente, uma espécie de guerra de posições permanente entre grandes países continentais, como é o caso pioneiro dos EUA, e agora é também o caso da China, Rússia, Índia e Brasil.

O sr. tem afirmado que a partir dos anos 1970, depois da consolidação do novo sistema monetário internacional "dólar flexível", os EUAs conquistaram um poder sem precedentes no capitalismo. Mas a crise financeira recente não expôs fragilidades desse sistema? Não há um declínio nessa hegemonia?
É verdade que depois da crise dos anos 70, a política monetária dos EUA, junto com a desregulação dos seus mercados financeiros, contribuíram decisivamente para o nascimento do novo sistema monetário internacional dólar-flexível, que já dura mais do que o sistema de Bretton Woods. E não há dúvida de que esse novo sistema transferiu para os Estados Unidos um poder monetário e financeiro sem precedente na história da economia mundial. Simplesmente porque, segundo as novas regras que não foram consagradas por nenhum tipo de acordo internacional, os EUA passaram a arbitrar simultaneamente o valor da sua moeda, que é nacional e internacional a um só tempo, junto com o valor dos seus títulos da dívida, que absorvem a poupança de todo o mundo e servem de âncora para o próprio sistema liderado pela moeda norte-americana. E finalmente, como consequência, os EUA podem redefinir, a cada momento, o valor das suas próprias dívidas, sem que seus credores possam reclamar sem sair perdendo. Nesse sistema, toda crise financeira da economia americana acaba afetando, em maior ou menor grau, a economia mundial, através da própria corrente financeira global do dólar flexível. Estas crises se repetirão mas elas não são necessariamente um sinal de fragilidade. Ás vezes, podem ser até um sinal de poder e o início de um novo ciclo expansivo. De qualquer maneira, estas crises não deverão alterar a hierarquia econômica internacional, enquanto o governo e os capitais americanos puderem repassar os seus custos, para as demais potências econômicas do sistema.
Aí, o conceito de hegemonia é extremante amplo e gelatinoso. Vai desde o exercício puro e simples da supremacia militar até a ideia de liderança econômica e moral dos povos. Acho que o poder global dos EUA, hoje, já não tem a ver com o sentido gramsciano de hegemonia. Trata-se de um poder imperial global, militar e financeiro. Ele inclui a possibilidade e a necessidade destas crises, que inclusive podem acabar resultando numa escalada ainda mais ampla de poder e riqueza _como aconteceu com os EUA, depois da crise dos anos 70 do século passado. Com exceção de um pequeno período de alguns poucos anos na década de 1990, nunca ninguém acreditou que o mundo fosse unipolar. Do meu ponto de vista, dentro do sistema inter-estatal em que vivemos, o conceito de multipolaridade é rebarbativo e tem pouco relevância do ponto de vista teórico. A despeito de que seja um termo útil no mundo diplomático.

O dinamismo da China não trará necessariamente consequências geopolíticas? Ela não deverá abandonar paulatinamente sua posição de fragilidade diplomática por uma ação mais enfática na diplomacia mundial? É possível enxergar a China como potência hegemônica mundial?
Hoje não há duvida que a grande novidade dentro do sistema mundial é a expansão econômica da China, e a sua disposição crescente de lutar pela hegemonia política e militar regional, na Ásia e no Pacífico Sul. Mas do ponto de vista geopolítico, o mais provável - nas próximas duas décadas pelo menos _ é que a China se restrinja à esta luta pela hegemonia regional, mantendo-se fiel à sua estratégia atual de não provocar nem aceitar nenhum tipo de confronto fora dessa sua zona de influência. Mas se a China seguir o caminho de todas as grandes potências do sistema inter-estatal capitalista, em algum momento futuro, terá que combinar a sua nova centralidade econômica mundial com algum tipo de projeção do seu poder político e militar para fora da sua própria região imediata. Mas há que ter em conta que a China tem uma posição geopolítica desfavorável, com um território interior amplo e cercado e uma fronteira marítima muito extensa, não contando ainda com um poder naval capaz de se impor ao controle norte-americano do Pacífico Sul. Sem poder naval, a China não irá muito longe. E tomarão muitos anos ainda para que a China venha a ter uma capacidade naval capaz de ameaçar o controle marítimo global da marinha norte-americana. O próprio Japão tem uma capacidade naval maior do que a China. E, com certeza, os EUA deverão incentivar o aumento do poder militar do Japão e da Coréia, com vistas a um equilíbrio de poder regional, que contenha a China dentro de sua própria região.

Como o sr. observa a posição europeia nesse jogo de poder?
Depois de 1991, aumentou o número de sócios da União Europeia e a extensão territorial coberta pela Otan. Mas a União Europeia está cada vez mais fraca, dividida e desorientada sobre como conduzir seus assuntos internos e sobre como se reinserir no novo sistema internacional, depois do fim da guerra fria e da reunificação da Alemanha. Está ficando cada vez mais claro qual a verdadeira causa desta perda de rumo: a União Europeia não dispõe de um poder central unificado e homogêneo, capaz de definir e impor objetivos e prioridades estratégicas, ao conjunto dos seus associados. Além disto, ela está cada vez mais dividida entre os diferentes projetos para a Europa: da França, Grã-Bretanha e Alemanha, que são seus Estados líderes e que têm entre si divergências estratégicas seculares. Divergências que ficaram adormecidas até o fim da Guerra Fria, mas que reapareceram depois com a reunificação da Alemanha e o ressurgimento da velha Rússia dentro do cenário geopolítico europeu. Com a sua reunificação, a Alemanha se transformou na maior potência demográfica e econômica do continente e passou a ter uma política externa mais autônoma, centrada nos seus próprios interesses nacionais. E, nesta linha, vem se envolvendo cada vez mais com a hegemonia da Europa Central. Ao mesmo tempo, vem estabelecendo laços cada vez mais extensos com a Rússia. Uma estratégia que recoloca a Alemanha no epicentro da luta pela hegemonia dentro de toda a Europa, ofusca o papel da França e desafia o americanismo da Grã Bretanha.
Nos próximos anos, não é impossível que Alemanha e Rússia busquem uma aproximação mais estreita, uma vez que a Rússia é a maior fornecedora de energia da Alemanha e de toda a Europa, além de ser a segunda maior potência atômica do mundo. E a Alemanha tem condições de fornecer à Rússia a tecnologia e os capitais de que necessita para recuperar o dinamismo econômico indispensável à uma grande potência. Esta aproximação afetará radicalmente o futuro da União Européia e de suas relações com os Estados Unidos. Não é improvável que traga de volta a competição geopolítica dos Estados europeus que foram os fundadores do atual sistema mundial.

E a atual crise econômica na Europa? O sr. acha que o euro sobreviverá?
A atual crise econômica européia não é apenas financeira nem se restringe à insolvência de alguns Estados de menor importância econômica dentro da comunidade. Do meu ponto de vista, se trata de uma crise monetária e de insolvência do próprio euro, uma moeda que é emitida por um Banco Central metafísico, que não pertence a nenhum Estado nem está associado a nenhum Tesouro Central. O novo sistema monetário europeu começou a ser construído com o Tratado de Maastricht, em 1992, e culminou com a criação do Euro, em 2002. Baseado na suposição dos dirigentes europeus de que esta nova moeda global conduziria à criação de um poder central capaz de geri-la. Mas até hoje o euro funcionou como uma espécie peculiar de moeda semi-privada e inconclusa, sendo aceita com base na crença privada e na certeza pública de que o BCE e a Alemanha cobririam todas as dívidas emitidas pelos 16 Estados membros da eurozona. Como ocorreu até 2008, permitindo que todos estes países praticassem taxas de juros quase iguais às da Alemanha, apesar da sua imensa desigualdade de poder e riqueza. Esta situação mudou depois do colapso financeiro de 2008, quando a primeira-ministra alemã, Ângela Merkel, estabeleceu o novo princípio de que cada país europeu teria que ser responsável, a partir daquele momento, pelos seus próprios bancos e pela cobertura de suas dividas soberanas. A consequência imediata da nova posição alemã foi a crise de insolvência de alguns governos da Europa Central, no ano de 2009, contornada pela intervenção do FMI. No início de 2010, entretanto, a denúncia do novo governo socialista da Grécia, de que o déficit orçamentário grego do ano anterior havia sido maior do que o publicado inicialmente, serviu como estopim de uma nova crise. Essa crise foi magnificada pelo veto alemão, durante seis meses, a qualquer tipo de ajuda comunitária ao governo grego. Até o momento em que a situação da Grécia ameaçou se estender a outros países endividados e acabou atingindo a própria credibilidade do euro. Isso obrigou a Alemanha a aceitar a aprovação apressada do Fundo Europeu de Estabilização Financeira, com capacidade anual de mobilização de até 750 bilhões de euros. Valor suficiente para contornar a crise imediata, mas incapaz de reverter a desmoralização do sistema monetário europeu, que foi criado em 2002, sob a tutela alemã. Para corrigir esta "falha de fabricação" do euro, a França propôs a criação de um governo econômico europeu, que não foi aceito pela Alemanha. O governo alemão, por sua vez, propõe, sem o apoio francês, a criação de um Fundo Monetário Europeu, para exercer o controle rigoroso da disciplina fiscal da eurozona, com o poder de expulsão dos faltosos. O impasse permanece, mas, assim mesmo, no curto prazo, se impôs a posição alemã, favorável a um ajuste fiscal draconiano de todos os países incorporados à zona do euro. Como o ajuste está sendo aplicado em economias que já estão estagnadas e com altas taxas de desemprego, é como colocar gasolina na fogueira e apostar numa profunda e prolongada recessão como fizeram os EUA no início da crise da década de 1930. Mas nada disto resolverá o problema da insolvência do euro, porque a moeda europeia só terá valor efetivo no momento em que for lastreada por um poder e por um tesouro central capazes de assumir a responsabilidade permanente pela sua sustentação, com base na sua capacidade de tributação e endividamento. Se isto não acontecer, e se os pequenos estados europeus não aceitarem a condição de províncias fiscais da Alemanha, o sistema monetário europeu e o próprio euro_ estão com seus dias contados.

Como o sr. avalia a aproximação entre EUA e Rússia?
Qualquer discussão sobre o futuro desta relação entre EUA e Rússia tem que partir do fato que os EUA seguirão sendo o pivot militar da Europa por muito tempo. Pelo menos enquanto mantiverem o controle das forças da Otan e dos arsenais atômicos da Alemanha, Itália, Bélgica, Holanda e Turquia. Neste sentido, a iniciativa ainda está nas mãos dos EUA. E os EUA têm pelo menos duas grandes alternativas estratégias possíveis com relação a como se conduzir com a Rússia. A primeira alternativa é manter a estratégia clássica, definida por Alfred Mackinder, no final do século 19. A mesma estratégia que foi seguida pela Grã-Bretanha, durante o século 19, e que foi mantida pelos EUA, depois do fim da Segunda Guerra Mundial: cercar e Rússia e impedir de todas as maneiras a sua aproximação da Alemanha. Esta foi de novo a opção dos EUA, depois do fim da guerra fria, com a incorporação militar da Europa Central à Otan e o estabelecimento de bases militares americanas nos territórios da Ásia Central, como forma de apoio às guerras do Iraque e do Afeganistão. Mas existe a possibilidade de uma segunda alternativa, mais inovadora e ousada, que poderia redesenhar o mapa geopolítico da Europa e do mundo, com efeitos imediatos sobre a geopolítica da Ásia Central e do Oriente Médio. Nesse caso, os EUA promoverão uma acordo de médio prazo de pacificação da fronteira russa, junto com uma acomodação negociada com o Irã, envolvendo o apoio da Rússia e a simpatia implícita da Alemanha. Sendo assim, a Rússia daria uma contribuição decisiva para a estabilização da Ásia Central e do Oriente Médio. Neste caso, através de uma negociação envolvendo o Irã e a Turquia, com vistas à construção de um novo equilíbrio de poder regional. Em troca disto, a Rússia teria o apoio norte-americano para retomar sua zona de influencia, e reconstruir sua hegemonia nos territórios perdidos depois da guerra fria. Desde que fosse sem o uso das armas, pelo caminho do mercado e das pressões diplomáticas, como lhes foi permitido e aconteceu com a Alemanha e o Japão, a partir da década de 1950. Esta aliança estratégica com a Rússia ajudaria a bloquear a expansão chinesa, e envolveria o apoio econômico americano ao desenvolvimento do capitalismo russo, com vistas à sua superação do seu viés atual, de natureza primário-exportadora. Mas não há que esquecer que Roosevelt tentou levar à frente uma estratégia parecida de incorporação da URSS, em 1945. Mas sua proposta foi atropelada pela sua morte e pela estratégia desenhada por Churchill e Truman, que levou à guerra fria. De novo, o projeto de Barack Obama pode revolucionar a geopolítica mundial, mas também pode ser atropelado pelas mudanças presidenciais que ocorrerão nos EUA e na Rússia, no ano de 2012. Mas, antes disso, o grande jogo de Barack Obama pode escapar-lhe ao controle, porque os EUA podem não conseguir conter ou controlar todas as forças sociais e políticas despertas, ou estimuladas, por esta gigantesca mudança geopolítica, dentro de cada um dos países envolvidos, na Ásia Central, no Oriente Médio e no Norte da África.

As crises capitalistas têm muitas vezes desaguado em guerras de grandes proporções. O sr. enxerga essa possibilidade?
Acho que devem multiplicar-se os conflitos localizados dentro do sistema mundial, envolvendo sempre os EUA, de uma forma ou outra. Mas não vejo no horizonte a possibilidade de uma grande guerra hegemônica do tipo das duas grandes guerras mundiais do século 20.

A América Latina poderá deixar sua condição tradicional de periferia exportadora para as grandes potências?
Na segunda década do século 21, depois de ultrapassados os efeitos imediatos da crise de 2008, o mais provável é que a América do Sul se mantenha na sua condição tradicional de periferia econômica exportadora. Mesmo quando se ampliem e diversifiquem seus mercados na direção da Ásia e da China. Para mudar essa rota, seria necessário uma decisão de Estado e uma capacidade coletiva de manter em pé o projeto integracionista, independentemente dos conflitos e divergências locais e das próprias mudanças futuras de governo. Além disso, seria preciso levar à frente a integração da infraestrutura física energética do continente e desenvolver cada vez mais o seu mercado interno, com a redução da sua dependência macroeconômica às flutuações dos mercados compradores e dos preços internacionais. Nesse ponto, não existe meio termo: os países dependentes da exportação de produtos primários, mesmo no caso do petróleo, serão sempre países periféricos, incapazes de comandar sua própria política econômica, e incapazes de comandar sua participação soberana na economia mundial. De qualquer maneira, o futuro da América do Sul será cada vez mais dependente das escolhas e decisões tomadas pelo Brasil. E o tempo urge porque se o Brasil seguir submetido aos desígnios dos mercados internacionais se transformará, inevitavelmente, numa economia exportadora de alta intensidade, de petróleo, alimentos e commodities, uma espécie de periferia de luxo das grandes potências compradoras do mundo. Como foram, no seu devido tempo, a Austrália e Argentina ou o Canadá, mesmo depois de industrializado. E se isto acontecer, o Brasil estará condenando o resto da América do Sul à sua condição histórica secular, de periferia primário-exportadora da economia mundial.

Como deverá evoluir a relação do Brasil com os EUA?
Hoje, o Brasil é o único país da América do Sul que tem capacidade e possibilidade de construir um caminho novo dentro do continente, combinando indústrias de alto valor agregado com a produção de alimentos e commodities de alta produtividade, sendo, ao mesmo tempo, auto-suficiente do ponto de vista energético. Entretanto, esta não é uma escolha puramente técnica ou econômica. Ela supõe uma decisão preliminar, de natureza política e estratégica, sobre os objetivos do Estado e da inserção internacional do Brasil. E, neste caso, existem duas alternativas para o Brasil: manter-se como sócio preferencial dos Estados Unidos na administração da sua hegemonia continental, ou lutar para aumentar sua capacidade de decisão estratégica autônoma, no campo da economia e da sua própria segurança, através de uma política hábil e determinada de complementaridade e competitividade crescente com os Estados Unidos, envolvendo também as demais potências do sistema mundial, no fortalecimento da sua relação de liderança e solidariedade com os países da América do Sul. Seja como for, é absolutamente certo que as escolhas brasileiras serão decisivas para o futuro da América do Sul.
Por outro lado, entre as chamadas potencias emergentes ou continentais, como a China, Índia e, talvez, Turquia, Irã e Indonésia, o Brasil é o país com maior potencial de expansão pacífica, dentro da sua própria região. Com a diferença essencial de que seu principal competidor na América do Sul são os próprios Estados Unidos. Mas, ao mesmo tempo, a expansão do Brasil, dentro e fora da América do Sul, contou até aqui com a vantagem de ser uma potência desarmada, porque de fato está situado na zona de proteção atômica incondicional dos Estados Unidos. Além disso, Brasil também usufruiu da condição de país ou nação formada dentro da mesma matriz cultural e civilizatória que os EUA. Mas chegará o momento em que o Brasil terá que tomar algumas decisões fundamentais com relação a estes dois pontos que favoreceram até aqui a expansão da sua influencia internacional. Em primeiro lugar, terá que definir o seu próprio projeto mundial e sua especificidade com relação aos valores, diagnósticos, e posições dos europeus e norte-americanos, com relação aos grandes temas e conflitos da agenda internacional. E, em seguida, o Brasil terá que decidir se aceita ou não a condição militar de aliado estratégico dos Estados Unidos, da Grã-Bretanha e da França, com direito de acesso à tecnologia de ponta como no caso da Turquia ou de Israel, por exemplo mas mantendo-se na zona de influência, proteção e decisão estratégica e militar dos Estados Unidos e de seus principais aliados europeus. Ou seja, o Brasil terá que decidir o seu lugar no mundo, a partir do seu pertencimento originário à tradição européia e cristã, que o distingue e distancia inevitavelmente, das outras tradições e potências continentais que deverão estar competindo com os Estados Unidos e entre si pela liderança mundial nas próximas décadas. E terá que decidir se quer ou não, ter algum dia a capacidade de sustentar suas posições fora da América do Sul com seu próprio poder militar.

Qual a importância do Mercosul?
O Brasil controla atualmente metade da população e do produto sul-americano, é hoje o player regional mais importante no tabuleiro geopolítico da América do Sul. Vem tendo uma presença cada vez mais afirmativa, mesmo na América Central e no Caribe. O Brasil aceitou o comando da missão de paz das Nações Unidas, no Haiti, tomou uma posição decidida a favor da reintegração de Cuba na comunidade americana e tem defendido, em todos os foros internacionais, o fim do bloqueio econômico à Cuba. Ao mesmo tempo, tem exercido uma razoável influência ideológica sobre alguns governos de esquerda da América Central e tomou uma posição rápida e dura frente ao golpe de Estado militar de Honduras, em junho de 2009, e na tensão com os Estados Unidos, com respeito à coordenação da ajuda ao Haiti, no terremoto de Porto Príncipe, no início de 2010. Mas apesar do seu maior ativismo diplomático, o Brasil ainda não tem possibilidade de competir ou questionar o poder americano, no seu mar interior caribenho. Na América do Sul, entretanto, o Brasil tem demonstrado, nestes últimos anos, vontade e decisão de defender seus interesses e o seu próprio projeto de segurança e de integração econômica do continente. Com a expansão do Mercosul, a criação da Unasul e do Conselho Sul-Americano de Defesa, o Brasil contribuiu para o engavetamento do projeto da Alca e reduziu a importância do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca e da Junta Interamericana de Defesa, que contam com o aval dos Estados Unidos. Além disto, o Brasil teve uma participação ativa e pacificadora nos conflitos entre Equador e Colômbia e entre Colômbia e Venezuela. E fez uma intervenção discreta e eficiente para impedir que o conflito interno da Bolívia se transformasse numa guerra de secessão territorial na sua própria fronteira e bem no coração da América do Sul. Além disto, em 2009, o Brasil assinou um acordo estratégico militar com a França, que deverá alterar a relação do Brasil com os EUA e transformar o país, em alguns anos mais, na maior potência naval da América do Sul, com capacidade simultânea de construir submarinos convencionais e atômicos e de produzir os seus próprios caças bombardeiros. Essa decisão não caracteriza uma corrida armamentista entre o Brasil e seus vizinhos do continente nem, muito menos, com os EUA. Mas sinaliza uma mudança da posição internacional brasileira e uma decisão brasileira de aumentar sua capacidade político-militar de veto, dentro da América do Sul, com relação às posições norte-americanas.
Nos momentos de crise forte não faltam os que afirmam vislumbrar a "crise final do capitalismo". Immanuel Wallerstein, por exemplo, acha que "a civilização capitalista chegou ao outono de sua existência". Por que o sr. discorda dessa tese?
Acho que já expus meu ponto de vista nas respostas anteriores. Mas podemos voltar ao assunto de forma mais direta e clara. É verdade que na crise dos anos 70 do século passado falou-se muito de fim da hegemonia americana e, inclusive, em alguns casos, em crise estrutural ou final do próprio capitalismo. E, no entanto, hoje está claro que a crise dos anos 70 não enfraqueceu o poder americano. Muito pelo contrário, transformou-se no ponto de partida de uma escalada no processo de acumulação vitoriosa do poder e da riqueza dos EUA, em escala planetária. E, agora, de novo, neste início do século 21, voltou-se a falar de uma crise terminal do poder americano e do capitalismo. Mas não existem evidências convincentes de que este colapso esteja ocorrendo ou vá ocorrer nos próximos tempos. A crise hipotecária e financeira americana, de 2007/2008 não se transformou numa crise econômica global. E não é provável que ela possa repetir, a médio prazo, a crise da década de 1930 ou, mesmo, a da década de 1970. O fracasso político norte-americano no Iraque não diminuiu o poder militar dos Estados Unidos, que segue sendo muito superior ao de todas as demais potências juntas. A economia norte-americana segue sendo a mais poderosa do mundo e mantém sua capacidade de inovação. Os Estados Unidos seguem controlando cerca de 70% de toda a informação produzida e distribuída ao redor do mundo. A moeda internacional segue sendo o dólar. O déficit externo não ameaça os Estados Unidos neste novo padrão monetário internacional dólar-flexível. E os Estados Unidos não parecem estar sem os "os meios e a vontade de continuar conduzindo o sistema de Estados na direção que seja percebida como expandindo não apenas o seu poder, mas o poder coletivo dos grupos dominantes do sistema", como pensava Giovanni Arrighi. As dificuldades políticas e econômicas dos Estados Unidos, no final da primeira década do século 21, poderão se prolongar e aprofundar. Mas, do nosso ponto de vista, com certeza não se trata do fim do poder americano nem, muito menos, da economia capitalista.
De qualquer maneira, o problema de fundo de todas estas profecias terminais não está na sua leitura imediata da conjuntura internacional deste início do século 21. Seu ponto fraco está na confusão que fazem entre planos e tempos históricos diferentes. O historiador francês Fernand Braudel falava da existência de pelo menos três tempos históricos diferentes: o tempo breve, da vida política imediata, do tempo cíclico, da vida econômica, e da longa duração, das grandes estruturas históricas. Sem distinguir estes planos e estes tempos diferentes pode-se confundir, com facilidade, o fim de um ciclo normal da economia capitalista com uma crise estrutural ou terminal do próprio capitalismo. E pode se considerar catastrófico um declínio relativo de um país que tenha acumulado uma quantidade excepcional poder, após uma guerra vitoriosa, como foi o caso dos Estados Unidos, depois de 1945, e depois de 1991. A partir deste momento vitorioso, é inevitável que a potência ganhadora perca posições relativas dentro da hierarquia mundial do poder e da riqueza, na medida em que avança a reconstrução dos Estados e das demais economias que foram derrotadas ou foram destruídas pela guerra. Nestes períodos de recuperação, a velocidade da reconstrução física e militar e do crescimento econômico dos derrotados ou destruídos tende ser maior do que o da potência líder. O que não se percebe, muitas vezes, é que a reconstrução e aceleração do crescimento destes países é, ao mesmo tempo, indispensável, para a acumulação de poder e riqueza da potência que está em "declínio relativo". E que esta potência em declínio é indispensável para o ascenso relativo das outras potências que estão se aproximando ou ultrapassando a potência líder. Por isso, se pode falar de um "declínio relativo" do poder americano, com relação à China, como já se falou do declínio do poder econômico norte-americano, com relação ao Japão e à Alemanha, na década de 1970. Mas esse declínio relativo dos Estados Unidos não significa, necessariamente, um colapso do seu poder econômico e da sua supremacia mundial. De qualquer maneira, por trás da visão de Wallerstein, como da minha própria, existem teorias diferentes sobre a origem e a dinâmica do sistema mundial. Wallerstein e Arrighi vêem a história mundial como uma sucessão de ciclos hegemônicos ou de acumulação de capital. Enquanto eu vejo este mesmo sistema como um "universo" em expansão contínua. Onde todos os Estados que lutam pelo poder global, em particular as grandes potências, estão sempre criando, ao mesmo tempo, ordem e desordem, expansão e crise, paz e guerra, sem perder sua preeminência hierárquica dentro do sistema. A visão deles está mais próxima da biologia e dos seus ciclos vitais. Enquanto a minha está mais próxima da física termodinâmica e da teoria das estruturas dissipativas.




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